Desde meados de junho, se desenrola uma guerra fratricida nas redes sociais entre integrantes da chamada “nova direita”, nome que uso aqui apenas para delimitar o incipiente grupo de militantes e formadores de opinião liberais e conservadores que surgiu nos últimos cincos anos na internet. Tudo começou com uma postagem do Deputado Eduardo Bolsonaro questionando a firmeza das posições do escritor e colunista Alexandre Borges, que havia aparecido em uma foto com o prefeito de São Paulo, o tucano João Doria.
No “Confronto”, programa que ancoro na Rádio Sonora, comentei o episódio, afirmando que o parlamentar se pretendia um Sherlock Holmes do conservadorismo puritano, e que, em matéria de pragmatismo político, nem mesmo seu pai, o também deputado Jair Bolsonaro, saia ileso. Mostrei que no passado recente, Jair Bolsonaro elogiou a nomeação de Aldo Rebelo para Ministro da Defesa de Dilma Rousseff e colocando-se à disposição para ser Vice na chapa presidencial de Aécio Neves.
Desde de que deu uma roupagem liberalizante ao tradicional esquerdismo soft do PSDB, Doria vem sendo visto com ceticismo por parte do eleitorado conservador, que tem em Jair Bolsonaro o candidato ideal nas eleições de 2018. Por ser integrante de uma sigla social democrata, atribuem a ele o rótulo de “Socialista Fabiano”, cuja serventia política seria a de fragmentar o eleitorado base de Bolsonaro e inviabilizar suas chances de vencer o pleito. De lambuja, em caso da vitória do próprio Doria, tais votos acabariam instrumentalizados em favor de um projeto economicamente liberal, mas culturalmente progressista.
É de se desconfiar do papel maquiavélico do Prefeito, até pelo julgamento que figuras tradicionais do PSDB fazem dele. O Ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso já lhe fez críticas públicas, reduzindo-o a mero criador de peças de marketing. Por sua vez, Alberto Goldman, Ex-Vice Governador de São Paulo e a atual Vice-Presidente do PSDB, o considera uma “desgraça” para o seu partido. Algum conspiracionista poderá dizer que tudo faz parte do embuste de jogá-lo para a direita como forma de enganar os conservadores incautos.
Mas, para além das elucubrações e das hipóteses, que contém boa dose de puro medo de concorrência, estão as dificuldades concretas que tanto Jair Bolsonaro quanto João Doria terão de enfrentar no próximo ano. Mesmo bem colocados nas pesquisas de opinião, ambos poderão acabar fora do pleito por razões bastante distintas mas igualmente complexas.
Antes de qualquer prognóstico eleitoral, Jair Bolsonaro tem uma batalha jurídica a enfrentar no Supremo Tribunal Federal. Réu pelos delitos de incitação ao estupro e injúria no episódio envolvendo a deputada federal Maria do Rosário, é grande a possibilidade de ele acabar condenado. Não porque de fato tenha infringido a lei, mas porque a atual composição da Corte leva a crer que sua decisão reinterpretará o instituto da imunidade parlamentar. Em junho do ano passado, escrevi para o portal Sul Connection um artigo no qual apontava o golpe jurídico que tomava forma contra Bolsonaro. Na ocasião, argumentei que “os quatro Ministros que resolveram torná-lo réu (Mello, em um surto de sanidade, votou contra) deram cabo do preceito constitucional que garante aos parlamentares que suas opiniões, palavras e votos são INVIOLÁVEIS”.
Se de fato for condenado, Bolsonaro cairá na Lei do Ficha Limpa e ficará inelegível por oito anos. Até aqui, todas as decisões tomadas pelo STF no processo fortalecem o meu apontamento. Na última delas, os Ministros da 1° Turma da Corte rejeitaram por unanimidade os recursos interpostos pela defesa do Deputado e que tinham como objetivo rever a decisão anterior de torná-lo réu.
Por sua vez, João Doria enfrenta um dilema partidário interno e um dilema público externo. No PSDB, teria de enfrentar seu próprio padrinho político, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. Na Prefeitura, teria de abrir mão de um cargo para o qual foi recentemente eleito com a promessa de cumprir o mandato até o fim. Em ambos os casos, o desgaste seria profundo, tanto com seus partidários quanto com seus eleitores municipais.
A direita nunca teve tantas alternativas para disputar uma eleição presidencial, e, ao mesmo tempo, os nomes que poderiam agradar parcelas consideráveis da direita nunca tiveram tantos obstáculos no caminho. Caso Bolsonaro e Doria de fato fiquem de fora, a guerra virtual dos conservadores em nome de seu candidato ideal poderá se converter no maior desperdício de tempo, ofensas e fúria da história das redes sociais.