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O Excesso de leis! Uma leitura a partir do programa Escola Sem Partido

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Este artigo conclui a análise realizada pela Lócus acerca do Programa Escola sem Partido, proposta de lei para tornar obrigatória, nas salas de aula do ensino médio e fundamental, a fixação do cartaz abaixo:

 

 

A fixação do cartaz não vem a ser a única medida prevista. Também tem a pretensão de inibir a prática da doutrinação política e ideológica em sala de aula e a usurpação do direito dos pais dos alunos sobre a educação moral dos seus filhos.[1] O que está em jogo é a aprovação de uma lei contra o abuso da liberdade de ensinar.

No primeiro artigo desta série foi apresentado o Projeto de Lei nº 190/2015 (que pretende instituir o Programa no âmbito do sistema estadual de ensino), do Deputado Estadual Marcel van Hattem, contextualizado numa perspectiva do sistema de ensino nacional e de parte dos problemas de formação cultural atualmente enfrentados no país. No segundo, sobre a base legal na qual está amparado o Programa, além de um quadro comparativo entre os projetos de lei federal e estadual (neste caso, especificamente, o do Rio Grande do Sul). Agora, neste terceiro e último, sobre as expectativas acerca de sua aceitação e cumprimento.

É preciso esclarecer que o progresso do conhecimento não é uma questão institucional isolada, mas sobretudo pessoal, de o estudante chegar em casa, sentar-se e estudar o que deve ser estudado. No Brasil foi possível destruir a continuidade cultural de uma geração para outra com indiscutível facilidade (parte dos motivos já foram apontados nos artigos antecedentes). Por conta disso, acredita-se que funk e pichação é cultura, que a polícia é fascista, que bandido é vítima da sociedade, dentre muitas outras anomalias que circulam no imaginário popular.

Para se ter um exemplo dos efeitos nocivos desse legado, num artigo publicado no site da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o título dizia “Combate à cultura do estupro vai além de punições penais” (07/06/2016). Até a OAB pensa que todo homem seja um potencial estuprador…

Ainda outro, valorizando a diversidade, o Dicionário Houaiss mudou definição do verbete família. A alteração, realizada a partir de uma campanha, buscou tornar a palavra “mais plural e fiel à realidade”: “núcleo social de pessoas unidas por laços afetivos, que geralmente compartilham o mesmo espaço e mantém entre si relação solidária“. Isso se deu em resposta ao Estatuto da Família, aprovado na Câmara dos Deputados em 2015, que apenas reconheceu como núcleo familiar aquele formado a partir da união de um homem e de uma mulher. Nem mesmo os dicionários foram deixados em paz…

Nas paredes de um restaurante de beira de estrada, o autor encontrou as seguintes normas de conduta que devem ser seguidas pelos consumidores no local: “Não lavar a cuia na pia”; “Não urinar no chão”; “Dar a descarga depois de utilizar o banheiro”; “Duas tolhas de papel são suficientes para secar as mãos”; “Não pisar na grama”; “Local exclusivo para funcionários (cozinha)”, “Não mexer nos objetos (que estão à venda)”. Como se já não bastasse o universo de um trilhão de leis no Brasil. No entanto, nem mesmo o desconhecimento das mesmas é possível de ser negado: “Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece”, aponta o art. 3º do Decreto-Lei n. 4.657/1942). Sim, a solução foi criar uma lei para obrigar o cumprimento das demais. Conta-se[2] um episódio no qual Getúlio Vargas (o mesmo responsável por essa lei) mandar chamar o seu Ministro da Justiça, o Doutor Chico, e diz:

– Precisamos de um Decreto para assunto “tal”.

Então o doutor Chico responde:

– Ora, já o temos.

Getúlio reafirma o seu propósito:

– Pois escreva outro: o anterior não funcionou.

Faz parte da cultura nacional o hábito de descumprir leis? Quais são as que de fato são cumpridas? O que se passa na Câmara Legislativa no município de Paim Filho? Bem, não há outra resposta senão: “Que importa?”

Portanto, torna-se imprescindível perguntar: a criação de uma lei vai resolver o problema da educação e da cultura nacional? O próprio site do Programa Escola sem Partido responde:

Não seria necessário, se a prática da doutrinação política e ideológica em sala de aula não estivesse, como está, disseminada por todo o sistema de ensino. Segundo pesquisa realizada pelo Instituto Sensus em 2008, 80% dos professores reconhecem que o seu discurso em sala de aula é “politicamente engajado”.

O importante é que a realidade seja encarada. Como bem disse o professor Olavo de Carvalho:

Já expliquei mil vezes: o marxismo não é uma doutrina, uma ideologia ou um programa político, algo portanto que a inteligência humana possa livremente dar sua aprovação ou desaprovação. É uma CULTURA – um sistema complexo de símbolos, regras de conduta, rituais, ídolos, tabus, normas de linguagem, preconceitos, temores etc. Tirar um sujeito da atmosfera marxista por meio de argumentos é tão impossível quanto transformar, por esse meio, um índio do Xingu em cidadão sueco ou um japonês em sudanês. O que existe nas escolas brasileiras não é DOUTRINAÇÃO, é ACULTURAÇÃO, um processo abrangente que cerca o indivíduo por todos os lados simultaneamente e no qual a “doutrinação” desempenha um papel modestíssimo ou nulo. Qualquer “doutrinação” é um processo puramente verbal. A aculturação vai infinitamente além do que a comunicação verbal pode alcançar.

Ninguém está atrás de privilégios no ensino: o que se quer é que ambos os lados da moeda sejam apresentados, e que a história seja contada como tal. O problema todo será encontrar pessoas capazes de apresentar o conteúdo de forma imparcial como tanto almeja a proposta. O ideal é que o Programa Escola sem Partido seja adotado pelo costume, e não por conta de um processo legislativo.

[1] http://www.programaescolasempartido.org/FAQs/. Acesso em 05/02/2017.

[2] Na verdade, ouvi essa história do professor Olavo de Carvalho numa das aulas do COF.

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