Duas cidades separadas por 3000 quilômetros e séculos de história demonstram que a bagunça orçamentária e cultural no Brasil não é para amadores. E lá no Pará ou aqui, precisamos de gestores qualificados, acima de tudo.
Na realidade, Passo Fundo e a paraense Parauapebas nunca trocaram diplomacias de irmandade municipal ou reservaram placas em praças para lembrar de um parentesco do tipo. De qualquer maneira, o fio condutor desta brincadeira está no fato das duas cidades, tão diferentes e tão distantes, possuírem quase o mesmo número de habitantes e uma quantidade muito próxima de eleitores aptos. Mas o governo federal tem um tratamento bem diferenciado para as duas na devolução dos impostos (repasses, no jargão orçamentário) e as duas populações também possuem relacionamentos distintos com o poder público e seus representantes.
O dr. Firmino Duro era o prefeito de uma Passo Fundo com 124 anos de fundação quando, em 1981, um povoado crescia rapidamente no vale do rio Parauapebas, no então município de Marabá, no estado do Pará. Por conta do início do projeto Ferro Carajás – a exploração da maior reserva mineral do mundo – milhares de pessoas foram morar na região, em uma corrida para a riqueza proporcionada pelas minas de ouro, minério de ferro e manganês da Companhia Vale do Rio Doce (hoje apenas “Vale”). A Vila de Parauapebas virou cidade em 1988, com estruturas precárias para as instituições e Câmara de Vereadores e prefeitura iniciando em galpões, literalmente.
Parauapebas tem uma área territorial imensa. São 6886 km2 contra 783 km2 de Passo Fundo, mas as duas cidades possuem uma área urbana bem similar. A vasta maioria da cidade paraense é tomada por florestas e terras indígenas. O raio do círculo na imagem possui 9,3 km.
Doença holandesa à brasileira
Possuir a maior reserva mineral do mundo dentro da cidade tem suas vantagens. Legalmente, estes municípios recebem compensações pela exploração de recursos minerais. Parauapebas é a campeã nesta arrecadação no estado do Pará e entre 2007 e 2016 recebeu do governo federal quase 2 bilhões de reais (valor somado, sem correção) em compensações financeiras. E planejar este orçamento deve ser uma tarefa das mais complicadas: em 2012 foram 282 milhões recebidos, depois 450 milhões em 2013 e 247 milhões em 2014. Que prefeito não adoraria uma complicação destas?
Em economia, Doença Holandesa (Dutch Disease) significa a redução do setor manufatureiro de um país por conta da exportação de recursos naturais, onde o mesmo passa a se especializar na produção destes bens e “esquece” de se industrializar. No longo prazo, é inibido o processo de desenvolvimento econômico. Por “à brasileira”, vamos observar o que faz uma comunidade com fartos recursos financeiros oriundos da atividade mineradora e de alguns diferenciais federais. Vira uma Dubai amazônica? Não é o que parece.
A riqueza da pobreza
Mesmo com a sorte do minério, Parauapebas ainda recebe complementação do FUNDEB (praticamente dobrando o valor para aplicação em educação) e mais bolsa-família do governo federal sendo “injetado” na economia local. Com todos estes “diferenciais”, o orçamento previsto em lei da cidade para 2016 foi de 1,04 bilhão de reais, contra 594 milhões de Passo Fundo. Vejam alguns números:
O orçamento bilionário de Parauapebas dá uma vantagem extraordinária quando o assunto é a contratação de CCs (Cargos de Confiança) na prefeitura. Segundo o site da instituição, são 632 CCs contratados, incluindo os 25 secretários, que ganham, cada um, um valor básico de R$12800,00. Já no ensino municipal existem outros 592 comissionados (quase todo o staff escolar da rede municipal, exceto professores, é CC!). Mas a coisa saiu do controle.
A imponente prefeitura de Parauapebas. A cidade tem um índice de incidência da pobreza (2003) de 42,03%, contra 27,91% de Passo Fundo. Índice de Gini? 0,39 contra 0,41. O número de empresas atuantes (2014) é de 3302 contra 9553. Pessoal ocupado assalariado no total são 47 mil pessoas contra 59 mil e o salário médio mensal é de 3,9 salários mínimos contra 2,8. O saneamento básico é um dos piores do Brasil, com grande parte da população sem acesso ao esgotamento e água potável.
No final de 2016, a prefeitura precisou assinar um termo de ajustamento de conduta (TAC) com o Ministério Público, com a promessa de demitir (pasmem) 1700 servidores comissionados e temporários. Sim, além dos CCs, havia a contratação de um mar de funcionários temporários. A medida deve economizar R$9 milhões por mês. E para piorar: a prefeitura alega que fechou 2016 no vermelho, com déficit de R$ 63 milhões nas contas públicas. Na confusão, ainda aparecem indícios de problemas em salários de médicos, onde alguns profissionais estariam ganhando até R$50 mil por mês. Com a crise e diminuição da arrecadação, o ano teria fechado com “apenas” 700 milhões, bem abaixo do previsto. Os protestos de funcionários e até mesmo empresários reclamando de falta de pagamento de contratos são frequentes. Pelas previsões orçamentárias de 2016, Parauapebas gastaria com pessoal cerca de R$ 440 milhões. Passo Fundo previu R$ 273 milhões. O gasto de folha dos paraenses é imenso.
Causas da crise
Uma cidade nova, falta de senso de comunidade, tradição e o poder na mão de poucos naturalmente pioneiros na criação de uma cidade no meio do nada, com as particularidades da região. A falta de controle federal no uso de verbas públicas, paternalismo e descaso. Todas estas são causas possíveis, mas com a população sendo a eterna vítima deste sistema fechado de administração. Acima de tudo e de qualquer maneira, pelo bem ou pelo mal, a falta de gestão em Parauapebas parece ser geral.
Nossa realidade
As coisas por aqui são bem diferentes, ainda que cada item destacado como possível causa dos problemas exista como um anjo mau no ombro de muitos daqueles que alçaram posições de destaque no legislativo ou no executivo passo-fundense. No outro lado, um anjo bom lembra sempre aos desavisados que sim, certas ações aqui podem ter um retorno imediato. As doenças estão todas por aí, mas possuímos alguns anticorpos.
Quando (até mesmo aqui no Lócus) buscamos os melhores temas para discussão ou elaboração de nossos textos e vídeos, a caracterização dos políticos locais e seus respectivos alinhamentos ideológicos sempre vem à tona. Até que ponto um prefeito pode comprometer uma comunidade inteira e quais são as ferramentas para este feito, ainda que invisíveis para quase todos os cidadãos? Indo além, seria a boa gestão uma realização possível no meio-termo, ou perdemos tempo e posições na história por escolhas ideológicas destes mesmos gestores?
Prioridades
Existe um certo grau de satisfação dos cidadãos por conta das ações de uma administração (que possivelmente monitora quase semanalmente vários itens para correções através de pesquisas) e este “valor” parece ser relativamente baixo em Passo Fundo. Tudo está bem se existe o Parque da Gare, a ciclovia e uma incrível adoração por múltiplos locais para a prática de skate. Tudo vai bem também na Câmara, com uma ampla maioria de vereadores governistas, eleitos através de uma igualmente enorme coligação que juntou DEM e PCdoB no mesmo barco. Tudo pelo bem republicano da cidade.
Nas últimos anos, Passo Fundo deliberadamente fez grandes investimentos para a instalação de uma empresa que não deu certo, pegou dinheiro emprestado com o BID, fez uma restauração milionária em um parque da cidade e gastou rios de dinheiro em marketing promocional da administração. Enquanto isso, fora do debate eleitoral (sim, acordamos só para duelar de 4 em 4 anos na internet), o maior “debate espontâneo” da cidade foi por ocasião do comportamento de um vereador na tribuna, mandando os cidadãos enfiarem um adesivo no aparelho excretor, seguido de perto pela vontade de ter hipermercados de qualquer tamanho instalados por aqui, ainda que os grandes projetos tenham ficado no mundo dos sonhos (quem não lembra do shopping futurista apresentado naquelas manifestações?).
Temos políticos locais que declaram pender para a esquerda, para a direita ou que ficam sentados no centro com uma vela em cada mão. Agora pergunte para qualquer um deles sobre a privatização da CODEPAS ou o cancelamento de políticas de cunho extremamente socialistas da administração atual. Dizem que não existem ateus em aviões em queda, nem autoproclamados direitistas eleitos tomando decisões com ameaça de perda do apoio popular (na realidade existem, mas são raros). Por isso, bem melhor do que a pergunta para Fulano e Ciclano sobre quais são as suas “tendências políticas”, é a fiscalização constante dos projetos de leis e atos do executivo. Trabalhem, nós sabemos muito bem o que são medidas liberais, que incham o estado ou que estão abaixo de conhecidas agendas internacionais.
Do ponto de vista prático, será que as boas ações dos gestores em cidades do tamanho de Passo Fundo e Parauapebas apenas “arranham” o problema e são eternamente dependentes das questões federais? Ainda que tenhamos bons governos, com prefeitos que adotem uma gestão eficaz dos recursos, a inclinação ideológica do gestor e seu partido é importante? Sim, mas de forma diferencial.
É populismo. Ou lupus.
Todo o aparato público municipal, Prefeitura e Câmara existe para fazer o que lhe é obrigação institucional, mas com alguns tons de cinza que, geralmente, trabalham em prol da sobrevivência dos próprios agentes eleitos. Não é por nada que políticos da situação desfrutam de uma posição quase sempre confortável nas disputas eleitorais, com dezenas de CCs trabalhando em campanhas, informações privilegiadas ajudando na criação de estratégias e todo um emaranhado de conexões, deputado “mandando dinheiro através de emendas”, vendido pelo marketing político como um abnegado e altruísta que tirou dinheiro do próprio bolso para comprar um raio-x do hospital, uma quadra de esportes, um tapume aqui e acolá. Muitas fotos, sorrisos e discursos fecham o pacote. Multiplique esta estrutura por 10 ou 100 em eleições inversas, para presidente, por exemplo.
As tradições e os costumes
Certa feita, a Mesa Diretora da Câmara de Vereadores de Parauapebas permitiu, através de resolução, aprovar o custeio de todos os gastos médicos de um vereador. O custo? R$96000,00. Em Passo Fundo, não existe qualquer plano de saúde para vereadores, que devem usar o SUS ou arcar com as despesas, por conta. Estas diferenças culturais, este limiar de aceitação nos faz diferentes, mas não podemos tomar por medida um extremo para justificar nossos exageros locais.
Muito provavelmente, a capital do Planalto Médio nunca encontrará uma mina de ouro, ferro ou manganês abaixo da Roselândia, ou petróleo no Banhado da Vergueiro. Não teremos um repasse bilionário do governo federal para fechar este parentesco peculiar. Mas sabemos o que acontece com altas somas de dinheiro, sociedade desatenta e políticos cuidando da coisa pública como se deles fosse. De qualquer forma, é bom ir treinando. Já visitou a transparência da prefeitura nesta semana?
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Dados dos repasses e orçamentos retirados das transparências federal, Prefeitura de Parauapebas e Passo Fundo e respectivas Câmaras de Vereadores.
Críticas à PMG de Passo Fundo acaba em discussão na Câmara. Petismo ataca novamente
Na Sessão Plenária do dia 18 de maio de 2022, Regina dos Santos (PDT) discutir recente projeto de autoria do Poder Executivo Municipal sobre a alteração do plano de carreira dos professores municipais.
Aproveitando a deixa, o petista Nicolau Neri Grando (PT) tira o foco do tema para tecer críticas à Procuradoria Geral do Município. De acordo com o parlamentar, os processos que passam pelas mãos da Procuradoria acabam atrasando o andamento: É um atraso em todos os processos que passam pela PGM”.
Wilson Lill (PSB), em seguida, manifestou o equívoco na fala de Gomes, pois apontou que em todos os processos a Procuradoria avalia o melhor caminho e busca encontrar soluções. Para ele, não é um debate de minutos, mas uma construção de diálogo que muitas vezes demandam meses de debates e alterações.
Nharam (União Brasil) pontuou: “A PGM não é um time invasor de terras lá do MST”. Janaína Portella (MDB), que em outra oportunidade já fez parte da PGM, disse que a análise segura dos pareceres jurídicos emitidos pela Procuradoria são imprescindíveis para a tomada de decisão dos gestores públicos. Nharam segue: “O senhor me envergonha com essas colocações. Acha que está falando do STF?!?”
Permitindo aparte, Gomes manifestou a intenção da sua fala referente à PGM:
Fake News se tornou um verbete comum no cenário político desde que Donald Trump o proferiu em alto em bom som, bem na cara da imprensa norte-americana. De lá para cá, como tudo que o ex-presidente americano faz ganha repercussão, esse ponto não ficaria para trás. Fake News são informações falsas com a intenção de enganar. Não é um engano culposo, mas doloso. Há intenção de enganar o público, apenas para marcar a narrativa.
Quando nos deparamos com as redes sociais de muitos políticos pelo Brasil afora, podemos ter a falsa impressão de que eles estão, de fato, resolvendo uma série de problemas da nossa sociedade, fazendo pautas importantes avançarem. Não é bem por aí…
“Encaminhamos um pedido de providência”
Vamos dar um exemplo do que ocorre em Passo Fundo. Ao ler “Encaminhamos um pedido de providências a respeito de…”, é comum ao leitor pensar que o problema está (ou num curto espaço de tempo estará) resolvido.
Um pedido de providência não passa de um encaminhamento, na maioria das vezes realizado pelos gabinetes dos vereadores, solicitando que o Poder Executivo Municipal realize determinada obra ou demanda de uma comunidade.
Se procurar, os pedidos de providência vão de trocas de lâmpadas até paz mundial (ok, estamos exagerando). Asfalto, pintura, limpeza de praças… por aí vai. Um vereador, neste ponto, acaba refém das próprias limitações que a lei lhe impõe. A execução de obras, enfim, é atividade do Executivo. Vereador legisla e fiscaliza (ou deveria fiscalizar).
Pedido de providência é um tipo de publicidade enganosa
Sobre pedidos de providência, muitos vereadores fazem a festa. Não queremos citar ninguém em especial. Infelizmente, poucos escapam dessa publicidade (enganosa) nas redes sociais.
Não estamos querendo dizer que o público está sendo dolosamente enganado: na verdade, o vereador faz o que a lei permite. Os pedidos, portanto, são realmente encaminhados.
O que dá a entender, por outro lado, é que o assunto está resolvido. Na maioria das vezes não está.
“Aprovamos um projeto”
Quando um político afirma “Aprovamos um projeto de minha autoria”, todo cuidado também é pouco. É difícil estimar precisamente, mas a falta de eficácia das leis no Brasil não é assunto para amadores. Talvez a vocação nacional seja descumprir leis. Não é de todo culpa do nosso povo: o nosso universo legislativo é um oceano inabarcável de normas.
Nesse sentido, uma parte considerável das leis aprovadas são “leis pra inglês ver”: elas existem no papel, mas não mudam a vida da população em nada (ou muito pouco). Lei aprovada, entendam, é papel; sua execução, é outra coisa.
Ao longo dos anos de trabalho na Lócus, foram inúmeras as referências que fizemos nesse sentido. Quase toda semana um vereador sobe na tribuna e reclama da falta de cumprimento de leis aprovadas. Para citar um único exemplo, da legislatura passada:
Toson abriu seu Grande Expediente fazendo uma críticas às cobranças recebidas pelos parlamentares sobre o número de leis propostas. Para o vereador, trata-se de uma distorção realizada sobre o trabalho legislativo.
No Brasil, conforme dados apresentados, há mais de 5 milhões de leis em vigor, segundo um estudo da Fiesp. Para Toson, há uma ideia de que, ao se criar uma lei, magicamente o problema estará resolvido no dia seguinte. Isto prova que, para a resolução de um problema da sociedade, a lei é apenas uma etapa, não o processo completo.
Para o parlamentar, a lei acaba sendo uma espécie de abstração para se criar uma ilusão que o problema está sendo solucionado, o que é muito distante da realidade. De acordo com um dos exemplos citados, há a lei que proíbe o consumo de bebidas alcoólicas nas ruas de Passo Fundo. O projeto havia sido proposto como forma de coibir as constantes denúncias de algazarras nas ruas do Município. O problema, no entanto, permanece.
Projetos em andamento: o marketing político desnecessário
Projetos em andamento também podem causar uma série de enganos no público. Veja, a seguir, recente postagem do deputado estadual Mateus Wesp (PSDB):
O que significa dizer que “um projeto foi aprovado numa comissão”? Nada além de que a pauta está tramitando, mas o caminho pode ser ainda longo (isso se for aprovado, é claro).
Nessa postagem de Wesp, o público percebe a notícia de outra forma, como se parte do problema já estivesse resolvido, mas não está.
Provavelmente esse projeto nem seja aprovado nesta legislatura. Pode ser que Wesp nem se reeleja deputado estadual. Pode ser que esse projeto reste engavetado. Pode ser que esse projeto seja esquecido. Pode ser que seja submetido à votação: pode ser aprovado ou não. Se for aprovado, pode ser que o Governador vete. Se vetar, os deputados poderão ou não derrubar o veto. Conseguem perceber parte do problema?
Por isso, não sejam enganados por postagens de políticos nas redes sociais. A palavra “lei”, no Brasil, está banalizada desde que éramos uma monarquia. Faça um favor a si mesmo e pare de ser enganado por esse tipo de postagem. E sobretudo pare de ser enganado por alguém com cara de bom moço, que fala bonito e que não tira o terço do pulso.
A petista segue a cartilha que ganhou coro nos últimos meses Brasil afora, falando em “pobreza menstrual”
A vereadora Eva Lorenzato (PT) protocolou duas emendas impositivas ao orçamento municipal para compra de absorventes para distribuição à população mais carente da cidade, além da promoção de uma campanha de conscientização quanto ao problema da pobreza menstrual. De acordo com a parlamentar:
“Com a renda per capita do povo pobre sendo de até R$ 87 por mês, se você é mãe, vai optar entre comprar um pacote de absorvente por R$ 15 ou comprar leite para seus filhos?”