A Constituição Federal de 1988 estabelece, no seu art. 22, XXIV, que é de competência privativa da União legislar sobre as diretrizes e bases da educação nacional.
Não são poucos aqueles que aceitam a imposição de normas de cima para baixo. Poderia alguém dizer que são as regras do jogo e isso está amparado constitucionalmente. Mesmo assim, tradicionalmente, o Direito foi uma construção contrária, de baixo para cima, na análise do caso concreto, até que a sociedade adotasse um conjunto de regras para si, efetivadas pelo costume.
O Estado determinou para si o dever de educar, um direito de todos. Alguns olharão para a redação do art. 205 da Constituição e dirão que também é um dever da família, em colaboração da sociedade. No entanto, diga-se de passagem: o que se tornou a educação senão um vínculo entre aluno e instituição?
Ivan Ilitch já falava na década de 1970 que a educação havia se tornado uma forma de distribuir socialmente os indivíduos. José Monir Nasser reforçou esse argumento. Já é possível inclusive estabelecer médias salariais de acordo com as categorias profissionais, ou ainda algum professor brasileiro sonha em enriquecer lecionando? O mesmo serve para muitas outras profissões. A educação, assim, tornou-se apenas uma ponte entre o ser humano e sua escolha profissional? Seria a educação, com base nisso, apenas um instrumento para tornar pessoas aptas para exercício profissional?
Trata-se de análise bastante restrita. Quando os olhos se voltam para o estudo da formação dos antigos gregos, a educação era vista como um ideal, no qual a pergunta principal não seria “o que se quer aprender” mas “que tipo de homem quer se tornar”. São medidas diferentes: na segunda, a educação é a base para a formação integral do ser humano como tal, e não apenas uma habilitação para o exercício profissional.
A lei que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional (LDB) aponta, no seu art. 1º, que “a educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais”. Não deixa de ser uma abordagem mais ampla do que a que se apresenta no texto constitucional, inserindo a educação numa base de valores. Mesmo assim, na leitura dos demais dispositivos, é possível perceber que este artigo não passou de palavras vazias, porque a educação não deixou de ser o vínculo com uma instituição de ensino.
Vale destacar que, a leitura de um único documento, embora mais recente e especializado, não exclui a análise dos demais, até porque o Direito Brasileiro deve ser compreendido como ordenamento, no qual as normas interagem, e não necessariamente se ignoram. Portanto, diz o Código Civil que compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos, dirigir-lhes a criação e a educação (art. 1634, I). Não seria de todo errado dizer, embora seja uma opinião minoritária, que a educação é antes um dever da família do que do Estado.
O Estatuto da Criança e Adolescente pontuou que “os pais ou responsável têm a obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino” (art. 55). Os pais que se dão o direito exclusivo de educar seus filhos podem ter problemas com o Estado. Isso sim não deixa de ser uma afronta direta ao poder familiar, porque o poder estatal está se colocando acima dela. Trata-se de um ataque direto a um dos pilares da cultura ocidental. Dois casos recentemente noticiados:
O Estado pode coibir abusos ao direito familiar, mas não tomar a frente das obrigações, e apenas em casos de omissão. Está cada vez mais ganhando força no país um coro de pessoas que querem garantir o direito de educar seus filhos em casa, evitando que se tornem massa de manobra política e ideológica. Na educação, o poder do Estado, sob nenhuma hipótese, pode se tornar maior do que o da família.