No ano passado, em 2016, durante o 8º Festival Internacional de Teatro de Rua de Porto Alegre, Carina Sehn encenou “In(penetrável”. Para quem chama isso de espetáculo, sua performance se resumia a ficar encolhida numa armação de madeira no meio do parque Farroupilha (Redenção).
Ela queria indagar se a solidão realmente existia, a sensação sentida e como isso acontecia nos tempos atuais. Um cachorro passou pelo local e urinou na estrutura, talvez o mais lúcido dentre os curiosos.
Pois o espetáculo passou. De tão insignificante, poucos deram realmente atenção.
De uns tempos pra cá, no entanto, isso virou uma febre. Tivemos que lidar com o QueerMuseu no Santander Cultural que, embora não fosse uma peça de teatro nu, era uma exposição com esse teor.
Em seguida teve aquela apresentação abominável nas pendências do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM), no mês de setembro, quando o bailarino e coreógrafo Wagner Schwartz, na 35ª edição do Panorama da Arte Brasileira, fez uma leitura da obra de Lygia Clark. Como se o fato de estar nu não bastasse, ainda foi capaz de interagir com uma criança que estava no local:
Muitas manifestações com pessoas nuas estão ocorrendo pelo Brasil afora. São protestos, dizem.
Agora, neste mês de outubro, uma apresentação do Festival de Dança de Londrina, com o curitibano Maicon K, no Lago Igapó, no espetáculo “DNA de Dan”, ele ficou nu dentro de uma bolha de sete metros, com o corpo coberto por substância translúcida:
(Foto: Fábio Alcover)
Moradores reclamaram, e a polícia foi obrigada a intervir, embora o espetáculo tenha seguido ao longo das quatro horas de duração.
Mesmo assim, sabe qual é o discurso que todas essas pessoas têm utilizado para a realização? A boa e velha “liberdade de expressão”, sem mesmo questionar se não há qualquer limite para isso.
Ainda, justificam-se dizendo “quem não quiser assistir, basta que desvie do local”. Ora, isso é o mesmo que um casal fazer sexo na praia e dizer “basta não olhar”.
Esqueceram-se, entretanto, que ato obsceno é crime? Eis o que diz o Código Penal Brasileiro:
Ato obsceno
Art. 233 – Praticar ato obsceno em lugar público, ou aberto ou exposto ao público:
Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa.
Escrito ou objeto obsceno
Art. 234 – Fazer, importar, exportar, adquirir ou ter sob sua guarda, para fim de comércio, de distribuição ou de exposição pública, escrito, desenho, pintura, estampa ou qualquer objeto obsceno:
Pena – detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.
Parágrafo único – Incorre na mesma pena quem:
I – vende, distribui ou expõe à venda ou ao público qualquer dos objetos referidos neste artigo;
II – realiza, em lugar público ou acessível ao público, representação teatral, ou exibição cinematográfica de caráter obsceno, ou qualquer outro espetáculo, que tenha o mesmo caráter;
III – realiza, em lugar público ou acessível ao público, ou pelo rádio, audição ou recitação de caráter obsceno.
Alguém é capaz de sair em defesa desse tipo de arte? O que antes era um direito à intimidade, uma questão de dignidade da pessoa humana, tem sido apresentado em praça pública, sem qualquer tipo de restrição ou vergonha. A arte, antes conhecida por cultuar o belo, tem se tornado objeto de verdadeiro desprezo pelos seus parâmetros atuais.