Se você ainda não viu, está mais do que na hora. A entrevista do professor Jordan Peterson à jornalista Cathy Newman para o canal Channel4 é um daqueles momentos mágicos da história política mundial, um daqueles vídeos que dá vontade de ver e rever.
A entrevista
No dia 16 de janeiro, o Channel4, um dos canais de TV aberta mais populares do Reino Unido, transmitiu a entrevista concedida pelo canadense e professor de Psicologia pela Universidade de Toronto, Jordan Peterson, à jornalista Cathy Newman (assista aqui).
Não é um fato público ou um contexto histórico específico que confere importância à entrevista. Também não é pelo fato de a pessoa entrevistada ser uma personalidade pública. A entrevista é genial porque Peterson dá uma aula de como debater em altíssimo estilo. Além disso, é relevante porque é um showcase de como a guerra cultural é travada no mundo todo.
Quem é Jordan Peterson
Isso não é desfazer da importância das personagens. Jordan Peterson é um dos grandes pensadores da era digital. Conta com mais de 400 mil seguidores no Twitter e mais de 720 mil na sua página no Youtube. Seus vídeos crescem em alcance na internet a cada dia e no Brasil muitos já foram traduzidos pelos canais Tradutores de Direita, Embaixada da Resistência, entre outros. Peterson é um crítico do pensamento pós-modernista e do marxismo cultural.
A sua análise é precisa e cientificamente rigorosa. Ele identifica a matriz comum das formas de manifestação mais frequentes da histeria esquerdista contemporânea e as expõem de forma irretocável. Não resta pedra sobre pedra: feminismo, cultura do oprimido, movimento LGBT, todos são desmascarados minuciosamente.
A entrevistadora
A entrevistadora infelizmente não é personagem tão interessante como o entrevistado. Cathy Newman não é uma autora ou uma pensadora original, mas tem reputação de ser uma jornalista implacável, que deixa seus entrevistados em saia justas. Não foi dessa vez.
O Debate
O mote da entrevista foi o lançamento do novo livro de Peterson, “12 Rules for Life: An Antidote to Chaos”. Ainda não há tradução para o português.
Os assuntos que ocuparam a maior parte da entrevista foram a crise da masculinidade, feminismo e ‘transgenerismo’. Em pouco menos de 30 minutos, Peterson dá uma aula de como debater com uma pessoa mal intencionada, que distorce cada palavra que é dita.
É difícil encontrar uma só passagem na entrevista em que Cathy não deturpa completamente as afirmações de Peterson. Mas não era só isso: as perguntas também eram postas de maneira que sempre implicavam Peterson como misógino ou homofóbico. Quase todas as perguntas que Cathy fez começavam com a expressão “so you’re saying that” (“então vocês está dizendo que”), seguida por uma completa deturpação do que Peterson disse anteriormente.
Um exemplo dentre dezenas: depois de discorrer que diferenças salariais entre homens e mulheres estão associados a outros fatores que não só gênero, Cathy pergunta “então vocês não acredita na diferença salarial [entre homens e mulheres]?” ou ainda “então você está dizendo que mulheres não são inteligentes o suficiente para dirigir grandes empresas?”.
E assim foi durante a meia hora de entrevista. O problema é que a tática não surtiu o efeito esperado. Peterson nunca se intimidou, nunca perdeu a calma, sempre respondeu de forma clara e precisa. Cathy foi vendo suas armadilhas sendo desarmadas uma a uma.
Memes retratando as interpretações capciosas de Cathy. “Mulheres querem homens fortes e competentes” diz Peterson. “Então você esta dizendo que mulheres são incompetentes?” responde Cathy.
Liberdade de expressão
O ponto alto da derrocada foi quando Cathy penetrou o terreno da liberdade de expressão. Aqui cabe uma introdução.
Peterson ficou conhecido mundialmente depois de iniciar uma campanha contra um projeto de lei do governo canadense que criminalizava o uso incorreto dos pronomes como um desrespeito a “identidade de gênero” individual.
A lei obrigava aos cidadãos a falar de modo específico sob pena de sanção penal. Obviamente a medida era uma clara tentativa de violação do direito de liberdade de expressão e Peterson foi uma das principais vozes críticas desse projeto no Canadá e por causa disso ganhou projeção internacional.
Ao tratar do tema, Cathy mais uma vez tentou colocar Peterson numa saia justa e perguntou: “por que seu direito de liberdade de expressão supera o direito de uma pessoa trans de não se ofender?”. Jordan respondeu:
“A fim de ser capaz de pensar que você tem que arriscar ser ofensivo. Veja a conversa que estamos tendo agora. Você certamente está disposta a arriscar a me ofender na busca da verdade. Por que você deveria ter esse direito? Está sendo bastante desconfortável. Mas você está fazendo o que você deve fazer: está ‘cavando’ para ver o que diabos está acontecendo. E é isso que você deve fazer. Você está exercendo sua liberdade de expressão para certamente arriscar a me ofender. E está tudo bem. Ao que me consta, mais poder para você!”
A resposta não chegou a ser filosoficamente profunda, mas foi acima de tudo verdadeira. Tudo o que Cathy fez nos vinte minutos que antecederam a essa pergunta foi tentar ofender Peterson, pintando uma caricatura grotesca do entrevistado. A resposta deixou Cathy atônita. Demorou quase 20 segundos para que ela conseguisse se recompor e fazer a próxima pergunta. E 20 segundo em televisão é uma eternidade! Foi um dos momentos mais embaraçosos da história da TV mundial.
Mudança de rumo: lagostas?
E depois disso foi um pesadelo para Cathy. Logo em seguida, em um outro momento em que ela se viu perdida e desorientada por mais um contragolpe de Peterson, ela muda rapidamente de assunto e pede a ele que fale sobre a ‘lagosta’. Peterson, surpreso com o pedido extemporâneo, começa a discorrer sobre o primeiro capítulo do seu novo livro em que ele contesta a ideia de que hierarquias são “construtos sociais do patriarcado ocidental” utilizando o exemplo das lagostas.
O sistema nervoso das lagostas, explica o professor, funciona de forma muito similar ao dos seres humanos. E, assim como os seres humanos, lagostas se organizam em hierarquias. Peterson usa o exemplo da lagosta para chamar a atenção de que existe uma explicação biológica para hierarquias sociais e que, portanto, elas não são meramente um construto cultural.
Eis que Cathy responde: “Então você está dizendo que nós devemos organizar as nossas sociedades da mesma maneira que as lagostas?”. Inacreditável!
Viralizando
A vitória de Peterson foi tão esmagadora e a derrota de Cathy foi tão vexaminosa que a entrevista rapidamente viralizou na internet. Só no canal oficial do Channel4 no Youtube, o vídeo publicado no último dia 16 de janeiro já conta com 8 milhões de visualizações. Uma infinitude de memes com referencia a entrevista circularam pela internet.
Não obstante, a cordialidade entre os dois manteve-se intacta. Cathy Newman postou no twitter “Adorei fazer o Battle [nome do programa] com você, Jordan – obrigado por ser um bom adversário”. Peterson, em uma outra entrevista concedida após essa, também dirigiu palavras de estima a Cathy.
“Eu tive bacon e ovos no café-da-manha” (Peterson), “Então você esta dizendo ‘mate todos os veganos” (Cathy)
A repercussão da vitória de Peterson galopava pelas redes sociais quando veio o golpe baixo da mídia. Passados três dias da entrevista, um dos editores do Channel4 postou no Twitter que, em face de um grande número de mensagens agressivas e direcionadas à Cathy nas redes sociais, o canal tivera que contratar “especialistas em segurança” para analisar as ameaças.
A notícia implicava que os ataques partiram de seguidores de Peterson, mais uma vez pintando uma caricatura do psicólogo e seus admiradores como fanáticos radicais. As supostas ameaças recebidas por Cathy foram noticiadas em todos os grandes jornais da Inglaterra.
Artigo do Independent denuncia ‘ataque misógino’ contra Cathy. A autora comparou as criticas à jornalista com ‘defender um estuprador em série’.
A Narrativa
O debate deveria ter sido noticiado como uma vitória acachapante de Peterson contra Cathy Newman. No entanto, transformou-se noutra coisa. Foi uma oportunidade de a grande mídia difamar e imputar todo tipo de acusações sórdidas a um dos grandes pensadores conservadores da atualidade.
Por mais que Conservadores e Liberais aprendam a debater com a mesma maestria que Peterson demonstrou, aniquilando seus adversários com calma e serenidade de um Buda, desviando das armadilhas como se fossem bolinhas de papel, dissecando argumentos como fossem corpos putrefatos, ainda assim a narrativa pública pode ser completamente falseada, e o resultado prático de uma vitória incontestável ser transformado, do dia para a noite, em uma notícia das páginas policiais na qual o debatedor vitorioso é “vilão, assassino, estuprador”.
Descreditar os farsantes da grande mídia parece ser o único caminho para semear vitórias efetivas no debate cultural. Eles estão dependentes de uma autoridade há muito tempo perdida.