A carga tributária brasileira é repetidamente apontada pelos empresários da indústria como o principal problema enfrentado pelo setor. De acordo com a Sondagem Industrial, divulgada trimestralmente pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), essa foi a alternativa de maior destaque (44,3% das respostas) entre os entraves existentes para o desenvolvimento dos negócios, bem à frente da segunda colocada – demanda interna insuficiente –, com 34,7%. Essa percepção não está restrita somente ao setor secundário, como também é compartilhada pelos demais ramos da atividade econômica e pelos consumidores.
O tamanho da carga tributária do Brasil
De acordo com os dados da Receita Federal e da OCDE para o ano de 2015, o Brasil tem a segunda maior carga tributária da América Latina, totalizando 32,1% do PIB, somente atrás de Cuba (38,6%). Além disso, em um comparativo internacional mais abrangente, é possível perceber que a quantidade de impostos, tributos, contribuições e taxas em relação ao tamanho da nossa economia se equipara à média dos países desenvolvidos, conforme os gráficos abaixo.
Tamanho da carga tributária (% do PIB) – América Latina e países selecionados – 2015
Fonte: Receita Federal e OCDE.
Quais as excrescências da nossa carga tributária?
Quando comparamos o tamanho da carga com os serviços públicos oferecidos à população, o quadro se torna deplorável. Entre as 30 nações com as maiores cargas tributárias do planeta, estamos em último lugar no ranking que mede o retorno dos impostos para a sociedade, aferido com base no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Dessa forma, enquanto o total arrecadado é semelhante à média do grupo mais rico, a qualidade das contrapartidas ofertadas é comparável ao mais pobre.
Índice de Retorno à Sociedade – posição – 2015
Fonte: Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT).
A principal distorção introduzida pelo sistema tributário brasileiro está na sua forma de cobrança. Ao contrário dos outros países, a maior parte da nossa carga recai sobre bens e serviços, enquanto os impostos sobre a renda são proporcionalmente baixos. A oneração elevada no primeiro caso prejudica os mais pobres, que gastam toda (ou a grande maioria) dos seus vencimentos com consumo. Ademais, serve para desincentivar a produção, tornando os produtos – sobretudo aqueles com número maior de etapas produtivas, para os quais incidem impostos em cascata – mais caros e pouco competitivos no exterior.
Tamanho da carga tributária (% do PIB) – Bens e serviços / renda e lucros – 2015
Fonte: Receita Federal do Brasil e OCDE.
Por sua vez, quando analisamos os impostos e contribuições sobre a folha e sobre a propriedade, verificamos que o Brasil está dentro da média mundial: 8,4% e 2,0% do PIB, respectivamente, contra 9,4% e 1,9% dos países da OCDE, em média.
Reforma tributária: quais devem ser os focos?
É necessário entender que a falta de avanços nessa agenda se dá pela multiplicidade de objetivos que envolvem o debate em torno do tema. Precisamos de três reformas tributárias, cada uma visando atacar individualmente os seguintes pontos:
Rediscussão do Pacto Federativo, ou seja, do total de recursos arrecadados disponíveis aos três entes federativos: União, Estados e Municípios.
Distribuição de renda e diminuição da desigualdade social;
Simplificação tributária.
Sobre o ponto 1, a maior parte dos recursos está nas mãos da União, e muito pouco concentra-se nas mãos dos municípios, conforme o gráfico abaixo. A maior descentralização serviria para aumentar a quantidade de recursos direcionados para as necessidades primordiais de cada cidade, servindo de contrapeso ao excesso de poder detido pelo governo federal no Brasil. Infelizmente há grandes resistências para a aprovação de mudanças, pois os que detêm a maior fatia do bolo hoje dificilmente desejarão abrir mão das somas arrecadadas.
Distribuição percentual (%) da carga tributária do Brasil por Ente Federativo – Brasil – 2016
Fonte: Receita Federal.
Sobre o ponto 2, há um claro problema. O Brasil apresenta pouca efetividade em reduzir o Índice de Gini, que mede desigualdade de renda (onde quanto mais próximo de zero, maior a igualdade), após realizadas as transferências estatais. Enquanto que o Reino Unido, por exemplo, consegue reduzir o Índice em 28,4% após as transferências, a eficiência do Brasil é de apenas metade desse valor (14,6%). A falta de avaliação constante dos custos e dos benefícios das políticas públicas é uma das causas desse fenômeno.
Índice de Gini da renda – antes e depois das transferências estatais – 2015
Fonte: Ministério da Fazenda.
No que diz respeito ao ponto 3, a complexidade da legislação tributária faz com que o Brasil seja o lugar onde o número de horas gastas no ano para o cumprimento das obrigações seja o maior do mundo. No ranking elaborado pelo Banco Mundial, conforme o trabalho Doing Business, estamos em último lugar nesse quesito (1.920 horas). Para a Bolívia, nação com o segundo pior resultado, são necessárias pouco mais de 1.000 horas. Esse é um dos fatos que, indubitavelmente, serve para tornar o ambiente de negócios pior no Brasil.
Número de horas necessárias para o pagamento das obrigações tributárias por ano – 2018
Fonte: Banco Mundial (Relatório Doing Business).
Por fim, muitos defendem que a reforma tributária atue para reduzir a quantidade de impostos pagos. Ainda que a racionalização da estrutura da máquina pública seja uma necessidade, a reforma tributária não resolveria esse problema. Na realidade, a carga tributária é apenas reflexo da estrutura de dispêndios criada para atingir determinados objetivos. Portanto, se quisermos pagar menos impostos, necessitamos controlar os gastos. É por isso que a chamada “PEC do Teto”, que limita o crescimento das despesas primárias da União por um período de 10 anos (prorrogáveis por mais 10), é fundamental. Outro elemento de suma importância é a reforma da Previdência, uma vez que aproximadamente 57% do orçamento público está alocado para o pagamento dos benefícios.
Conclusão
As reformas tributárias necessárias ao país passam pelo atendimento das seguintes questões:
(1) reduzir o fardo existente sobre os bens e serviços e tributar mais a renda, tornando assim a arrecadação socialmente mais justa;
(2) aumentar a descentralização dos recursos arrecadados, de modo a direcioná-los para os municípios, onde a vida das pessoas, de fato, transcorre;
(3) promover a simplificação tributária, com o intuito de diminuir os custos relacionados ao cumprimento das obrigações.
Já a magnitude da carga não deve ser resolvida através de reforma tributária, mas sim via imposição de limites à expansão dos gastos governamentais.
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