Pesquisas eleitorais são fontes de teorias da conspiração, desconfiança e declarações de amor e ódio, dependendo do resultado para o candidato do observador. Bem feitas, realizam a mágica de revelar a verdade sobre um país inteiro com um punhado de entrevistas.
As pesquisas eleitorais tomam conta do noticiário durante o período eleitoral. São atacadas e defendidas por diferentes candidatos, com o sentimento favorável geralmente próximo dos beneficiados pelo resultado. Os grandes institutos que desenvolvem esse trabalho cobram muito dinheiro das empresas de comunicação. Estas, por sua vez, “revendem” essa atenção em forma de audiência para anunciantes no intervalo comercial dos noticiários, páginas dos jornais e publicidade na internet.
A população vê com certo espanto a mágica dos números, jogados na tela em forma de gráficos com uma explicação técnica que não passa do já decorado “2% para mais ou para menos” e “probabilidade de 95%”. E quase todo mundo questiona como um conjunto de entrevistas em dois ou três dias com cerca de 3.000 pessoas mostra a verdade sobre a intenção de voto de 147 milhões de eleitores.
Analogias simples do dia a dia ajudam a explicar que sim, é possível pegar uma amostra de um todo e obter um bom resultado em valores. Especialistas da área gostam de usar o exemplo da sopa: experimentamos uma “ponta de colher” para avaliar se está boa de sal – ou o exame de sangue, do qual uma seringa pode revelar a saúde de todo o corpo. Mas eleitorado não é sopa e nem de longe apresenta uma homogeneidade similar.
Entre as diversas pesquisas realizadas durante o período eleitoral de 2018, vamos analisar dois trabalhos recentes da empresa IBOPE INTELIGÊNCIA PESQUISA E CONSULTORIA LTDA, velha conhecida do público brasileiro não apenas pela mensuração de resultados eleitorais, mas também diversos aspectos da vida cotidiana e audiência das emissoras de TV.
As pesquisas BR-05221/2018 e BR-09678/2018 foram registradas no TSE pelo IBOPE em 11 e 18 de setembro e entrevistaram 2.002 e 2.506 eleitores, respectivamente. As cidades sorteadas para representar o eleitorado brasileiro são diferentes.
Cidades onde foram realizadas entrevistas para a pesquisa BR-05221/2018.
Cidades onde foram realizadas entrevistas para a pesquisa BR-09678/2018.
Na região Sul, podemos observar que as cidades sorteadas variam consideravelmente em número de eleitores e realidades culturais nas duas pesquisas. No conjunto em cada uma delas, as cidades escolhidas somam um número parecido de eleitores, segundo dados do TSE para as eleições de 2018. Veja:
BR-05221/2018
BR-09678/2018
Cidade
Eleitores
Cidade
Eleitores
Porto Alegre
1100163
Porto Alegre
1100163
Alvorada
128956
Taquara
41633
Estância Velha
35212
Campo Bom
52264
Novo Hamburgo
180249
Esteio
68809
Viamão
148618
Novo Hamburgo
180249
Cambará do Sul
4883
Sapucaia do Sul
105070
Independência
5437
Antônio Prado
9988
Ijuí
64622
Iraí
6140
Quaraí
16768
Victor Graeff
2433
Lajeado
60191
São Borja
48585
Arroio do Padre
2642
Santa Cruz do Sul
102520
Canela
31263
Canguçu
44673
TOTAL
1747741
TOTAL
1793790
Cidades sorteadas nas pesquisas BR-05221/2018 e BR-09678/2018. Regiões diferentes que respondem pela “vontade do eleitorado” no Rio Grande do Sul. Os entrevistadores do IBOPE visitaram entre 11 e 13 cidades no RS que somam cerca de 1,7 milhão de eleitores (entre os 8,3 milhões do Estado).
A pesquisa, de fato
A TV divulga a oscilação entre intenções de votos entre as pesquisas, rejeição e diversas simulações para o segundo turno, sempre finalizando com os dados técnicos mais básicos como a margem de erro, confiabilidade, número de eleitores entrevistados, número de cidades e registro. Mas os questionários do IBOPE perguntam outras coisas que não são reveladas pelas emissoras.
Os entrevistadores (alguns terceirizados pelo IBOPE) carregam um questionário de 6 páginas, juntamente com cartões de resposta e discos com os nomes dos candidatos (a disposição em disco visa não favorecer posição do candidato ao questionar o eleitor).
Disco que é mostrado ao entrevistado após a pergunta estimulada sobre a opção de votos.
No papel (ou em um tablet), a primeira página é dedicada para a qualificação do eleitor em diversos aspectos (como escolaridade e profissão) e a marcação de informações internas do próprio sistema. Um roteiro orienta o entrevistador para a ordem das perguntas e as condições para questões específicas.
Um sequência de perguntas do tipo “em quem você votaria” segue o roteiro. Curiosamente, antes de perguntar “em quem o senhor(a) não votaria de jeito nenhum”, o entrevistado é indagado nestas palavras:
O candidato do PT, Lula, foi impedido de disputar a eleição para PRESIDENTE DA REPÚBLICA. Considerando que Lula declarou seu apoio a Fernando Haddad, o(a) sr(a) com certeza votaria em Fernando Haddad, poderia votar nele ou não votaria em Fernando Haddad de jeito nenhum?
Nenhum outro candidato recebe este destaque “paralelo”. O entrevistado é lembrado da existência desta transferência na chapa petista antes de opinar sobre a rejeição de voto. Seguem questões gerais sobre a disputa e adicionais como: avaliação do governo Temer, meios de comunicação usados para decidir o voto, emoções pessoais, raça, religião, o que pensa sobre impostos, quantas vezes acessa a internet e faixa salarial. O questionário completo pode ser baixado neste link. As informações mais detalhadas de cada pesquisa são publicadas no site do IBOPE.
O TSE mantém um site onde todas as pesquisas realizadas (e registradas) durante as eleições são listadas. O PesqEle é a fonte mais indicada para a busca de informações sobre estes levantamentos. Não é possível para o eleitor fazer uma análise imediata das pesquisas através do site, já que a para a publicação dos dados sobre as cidades visitadas nos levantamentos pode ser realizadas em até 7 dias após o registro da pesquisa.
Não há como “colocar a mão no fogo” sobre pesquisas sem observar todos os detalhes sobre o desenvolvimento destes trabalhos, o nível de auditoria que cada passo do processo recebe de terceiros (especialmente na aleatoriedade das cidades e locais visitados). O grande público não tem acesso a esta informação e resta a todos manter a confiança nos órgãos de controle e na Justiça Eleitoral. Em tempo: os próprios institutos repetem eternamente que a pesquisa apenas “captura um momento” do eleitorado e não deve prever o resultado de uma eleição. No passado, erros e acertos memoráveis já foram registrados em pesquisas e em 2013 uma CPI do IBOPE apontou fortes indícios de fraude no interior do Paraná.
A melhor “pesquisa” sempre foi e sempre será a da urna, com 100% de acerto.