Como se não tivesse bastado os crimes configurados com a QueerMuseu (Santander Cultural) e com a apresentação do bailarino e coreógrafo Wagner Schwartze (Museu de Arte Moderna) há pouco tempo, nova exposição conceitual é sediada em Porto Alegre: conheça a “Santificados”.
Segundo consta na página do evento do Facebook, a exposição SANTIFICADOS, de Rafael Dambros, é o resultado de uma pesquisa autônoma de 4 anos sobre a iconografia católica e a sua importância dentro da educação cultural. A pesquisa contou com o auxílio do Dr. Celso Bordignon e tem curadoria de Mona Carvalho.
A exposição reúne cerca de 15 obras, em sua grande maioria desenhos de diversos tamanhos variando do papel à tela, com técnicas mistas de pintura e desenho tendo a caneta esferográfica como base. Embora a exposição seja inédita, algumas das obras, como o desenho de “São João Batista”, já participou de exposições coletivas em Porto Alegre em editais da Casa Chico Lisboa, incluindo a BIENAL C, que expôs as obras em pontos como o Atelier Livre, Câmara de Vereadores de Porto Alegre entre outros. Segundo informado, a obra circulou pelo Estado em exposições diversas, inclusive recebendo visitas de escolas.
RAFAEL DAMBROS Rafael Dambros é caxiense, formado em produção audiovisual pela Universidade Estácio de Sá no Rio de Janeiro, onde viveu por sete anos trabalhando para a RECORD e como professor de desenho e pintura artística em escolas profissionalizantes e na ONG SERCIDADÃO.
Em 2006, realizou sua primeira exposição individual, intitulada “Efeitos” no Centro Cultural Suassuna, RJ, com seus primeiros desenhos em caneta BIC. De 2007 até 2011, concentrou-se em pesquisas técnicas e experiências sensitivas na composição. Nos anos seguintes, dedicou-se a participar de projetos culturais e exposições coletivas na cidade de Porto Alegre e São Paulo. Alguns de seus trabalhos estão em acervos particulares em Porto Alegre, Rio de Janeiro, São Paulo, Glasgow, Amsterdan e no AMARP, em Caxias do Sul.
Atualmente o artista segue produzindo em seu atelier na cidade de Caxias do Sul, mesclando técnicas de pintura com desenho produzindo obras com características pop, minimalistas e realistas amparadas por longas pesquisas de temáticas atuais ou revisitando conceitos.
O artista plástico Rafael Dambros (Imagem: Camila Domingues/ Facebook do Evento)
AUXÍLIO NA PESQUISA ICONOGRÁFICA: Frei Celso Bordignon
Segundo informações também contidas na página do evento no Facebook, Celso Bordignon, conhecido como Frei Celso na cidade de Caxias do Sul, foi parceiro do projeto SANTIFICADOS auxiliando o artista Rafael Dambros em sua pesquisa iconográfica. O Frei Celso tem mestrado e doutorado realizados em Roma, ambos voltados para técnicas de pinturas da antiguidade. Foi diretor do Museu dos Capuchinhos, inaugurado já sob a sua coordenação no ano de 2001. Desde então, o Frei cuida do acervo histórico, que guarda os mais diversos documentos sobre a história da Ordem Franciscana no Rio Grande do Sul, história que começou no ano de 1896.
Não é a primeira vez que os capuchinhos entram em polêmicas. Em 2018, os padres capuchinhos gaúchos homenagearam Lula e ofereceram pousada para quem viesse a Porto Alegre protestar em frente ao TRF-4 no dia do seu julgamento. Veja:
Algumas polêmicas
Em Caxias do Sul, em 2018, a exposição já havia sido realizada, inclusive sendo alvo de muitas críticas, sobretudo da população local. Veja:
O Grupo RBS publicou matéria sobre a exposição em Porto Alegre, na qual o artista entrevistado disse:
Ao longo desse trabalho, descobri que os santos eram mortos das maneiras mais cruéis possíveis, porque eles tinham a filosofia de Jesus de levar o amor para lugares intolerantes e também porque eles batiam de frente com o poder vigente. Aí, me perguntei: quem são essas pessoas hoje? São aqueles que lutam pelos direitos humanos, das mulheres, da comunidade negra e da população LGBT+. São esses indivíduos que exercem essa função e são apedrejados por isso.
A Exposição
Abaixo, é possível ver algumas das imagens realizadas pela equipe da Lócus no local da exposição.
Como é possível ver abaixo, o evento contou com a presença de Gaudêncio Fidelis, o curador da Exposição QueerMuseu, do Santander Cultural:
A violação de direitos presente na Exposição
Muitas imagens representam verdadeiro atentado aos cristãos, violando a redação do art. 5º, VI da Constituição Federal:
VI – é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
Não há qualquer restrição de idade à entrada de menores de 18 anos no local. Na página do Facebook que divulga o evento, conforme mostrado anteriormente, informa que algumas das obras já receberam visitas de escolas (quando expostas em outros lugares) – embora, quando visitada na sua inauguração, não tivesse sinal da presença de menores de idade no local, não havia qualquer cartaz indicando o teor das obras e nem restrição à entrada. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) aponta que é “dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária” (art. 4º). E ainda:
Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.
Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.
Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos:
I – ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais;
II – opinião e expressão;
III – crença e culto religioso;
IV – brincar, praticar esportes e divertir-se;
V – participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação;
VI – participar da vida política, na forma da lei;
VII – buscar refúgio, auxílio e orientação.
Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.
Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor.
É preciso lembrar ser “dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente” (art. 70). Portanto,
Art. 74. O poder público, através do órgão competente, regulará as diversões e espetáculos públicos, informando sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada.
Parágrafo único. Os responsáveis pelas diversões e espetáculos públicos deverão afixar, em lugar visível e de fácil acesso, à entrada do local de exibição, informação destacada sobre a natureza do espetáculo e a faixa etária especificada no certificado de classificação.
As crianças e adolescentes só podem ter acesso às diversões e espetáculos públicos classificados como adequados à sua faixa etária (art. 75), sendo que as crianças menores de dez anos somente poderão ingressar e permanecer nos locais de apresentação ou exibição quando acompanhadas dos pais ou responsável (art. 75, Parágrafo Único). E ainda:
Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados:
I – por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;
II – por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável;
III – em razão de sua conduta.
A injúria constitui violação tipificada pelo Código Penal, para o qual:
Art. 140 – Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:
Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.
1º – O juiz pode deixar de aplicar a pena:
I – quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria;
II – no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria.
2º – Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes:
Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência.
3º – Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência:
Pena – reclusão de um a três anos e multa.
As imagens também constituem crime de ultraje a culto:
Art. 208 – Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso:
Pena – detenção, de um mês a um ano, ou multa.
Parágrafo único – Se há emprego de violência, a pena é aumentada de um terço, sem prejuízo da correspondente à violência.
As obscenidades presentes na exposição podem violar os seguintes dispositivos do Código Penal:
Escrito ou objeto obsceno
Art. 234 – Fazer, importar, exportar, adquirir ou ter sob sua guarda, para fim de comércio, de distribuição ou de exposição pública, escrito, desenho, pintura, estampa ou qualquer objeto obsceno:
Pena – detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.
Parágrafo único – Incorre na mesma pena quem:
I – vende, distribui ou expõe à venda ou ao público qualquer dos objetos referidos neste artigo;
II – realiza, em lugar público ou acessível ao público, representação teatral, ou exibição cinematográfica de caráter obsceno, ou qualquer outro espetáculo, que tenha o mesmo caráter;
III – realiza, em lugar público ou acessível ao público, ou pelo rádio, audição ou recitação de caráter obsceno.
Considerações finais
Espera-se que, a partir deste ano, ações movidas no campo da arte comecem a ser contidas, sobretudo quando há crimes tipificados no evento.
Em matéria recente aqui na Lócus foi mostrado que tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 9000/17, do agora Ministro da Casa Civil Onyx Lorenzoni (DEM/RS), que criminaliza o uso de recursos públicos para a realização de projetos artísticos que promovam a sexualização precoce de crianças e adolescentes ou façam apologia a crimes ou atividades criminosas.
Há também o PL 10583/2018, de autoria da deputada federal Mariana Carvalho (PSDB/RO), quer a inclusão de medidas de conscientização, prevenção e combate à erotização infantil (sexualização precoce) nas escolas públicas do Brasil. O Projeto está aguardando Designação de Relator na Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF) da Câmara dos Deputados.
Embora seja um momento de esperança, nada será resolvido se as autoridades competentes não cumprirem seu papel fiscalizatório, permitindo que eventos dessa natureza ganhem novos tentáculos sobre a cultura nacional.