Eduardo Leite entra de mala e cuia no rol dos políticos que acreditam que mamar no Estado é a melhor saída, apesar do verniz de bom moço que só quer espalhar amor
Setenta e sete dias se passaram entre a renúncia de Eduardo Leite ao cargo de governador e o anúncio de sua pré-candidatura à reeleição, selando o que passa a ser uma carreira política delimitada por duas grandes mentiras: a do pagamento em dia do funcionalismo público no primeiro ano de governo – compromisso eleitoral – e a mais cruel de todas (sim, tem mais), que é a promessa de não tentar a reeleição.
Neste período, Leite publicou pelo menos 96 vezes no Facebook um pouco da sua rotina, em meio a lembranças da sua época de governador e sua limitada vida pessoal, quase sempre acompanhado pelos cães. O ex-governador também se esforçou em sua campanha para tentar ser presidente pelo PSDB com um final trágico: os tucanos saíram do “Nem Lula nem Bolsonaro” para “Nem Dória nem Leite, talvez Tebet”.
De volta pra casa, Leite começou a aprontar, criando uma realidade alternativa para justificar a sua candidatura à reeleição, com a narrativa “já que houve a renúncia, não é a mesma coisa”. É difícil acreditar que até os tucanos gaúchos engoliram fácil essa cantilena. A julgar pelas presenças no indefectível “ombro a ombro” de políticos acompanhando Leite nas coletivas, parece que sim, compraram. Ou pior, são parceiros no crime (no sentido figurado, é bom lembrar).
Relembrando a renúncia de Eduardo Leite
Nós comentamos aqui a entrevista coletiva do governador no dia 28 de março, um longo discurso cheio de frases feitas e pouco sentido prático, acompanhado de um vídeo com tons de campanha eleitoral, que declarou a renúncia de Leite e a pré-candidatura do vice Ranolfo, para “continuar o trabalho construído junto”.
Na ocasião, Leite foi indagado pelo jornalista Eduardo Amaral, do Jornal NH, sobre a eleição local. Da longa resposta, destacamos:
“O PSDB liderou este projeto até aqui e tem um grande nome para liderar este projeto que é o nosso vice-governador delegado Ranolfo. Conhece o governo, conhece o estado, tá por dentro dos projetos, participou de cada passo e é um grande nome para dar continuidade a este projeto, é o nome que eu defendo.
“(…) E por isso eu tenho confiança no Ranolfo pra conduzir não apenas estes 9 meses deste nosso projeto que construímos juntos como tenho total confiança que ele está credenciado para liderar também o estado nos próximos 4 anos.”
Anotem: Leite saiu do governo achando normal alguém disputar eleição estando no cargo.
O anúncio da pré-candidatura
Em entrevista coletiva no último dia 13 de junho, Leite fez outro longo discurso. Parece difícil de acreditar, mas ele disse isso ao lado do hoje governador Ranolfo, homem que poucas horas atrás era um pré-candidato no cargo.
“Foi também a renúncia que me deixou mais confortável para disputar um novo mandato. Fora do cargo, fora do poder e sem contaminar a máquina pública. Podemos ser um candidato a governador e não um governador candidato. O Brasil deu exemplos de que a reeleição no cargo muitas vezes não é um bom caminho, e tá aí o mensalão em uma oportunidade, o orçamento secreto em outra, que estão aí para provar. Mas o Rio Grande, mais uma vez, à exemplo de que é legítimo, é possível, benéfico, separar o governo e a eleição. O governador e o candidato. Sem usar instrumentos do poder para conquistar votos ou para conquistar alianças e apoios. Assim como eu fiz em Pelotas, quando eu fiquei no governo e a minha vice-prefeita foi disputar a eleição, agora sou quem parte para a disputa e o meu vice-governador, hoje governador, cuida do governo. Aliás, sendo um excelente governador, o que se provou desde o dia 31 de março quando assumiu o governo. Estar fora do cargo é a única maneira que eu aceitaria disputar a reeleição. Eu mudei de opinião mas eu não mudei de princípios. Por isso eu já disse tantas vezes que a renúncia me abria todas as possibilidades e não me retirava nenhuma. Uma das possibilidades era disputar o governo do Rio Grande do Sul”.
Será que tudo isso de ruim aconteceria na candidatura Ranolfo? As coisas mudam muito rápido na realidade de Eduardo Leite.
Acima, Eduardo Leite “contaminando a máquina” durante a visitação de obras do Governo RS no início de junho. O agora candidato não perde uma oportunidade para estar presente em eventos assim, quase sempre rodeado de deputados do partido.
A pensão – Eduardo Leite melhorando a própria vida.
Novo versus Eduardo Leite: o deputado Fábio Ostermann aponta o absurdo do recebimento de pensão, Leite devolve a acusação de fake news e desvia o foco para o tempo do benefício e sua legalidade. Já passou da hora do deputado e do ex-governador debaterem ao vivo na TV ou em um canal do Youtube.
O jovem e cheio de saúde ex-governador vai ganhar uma aposentadoria de cerca de R$ 20 mil, por quatro anos. Na última semana, um embate surgiu na internet com os supostos R$ 40 mil que seriam pagos a Leite. Na realidade, o valor que corre pela mídia é referente a 2 meses pagos de uma só vez. O próprio governador sancionou uma lei em 2021 que acabava com as pensões vitalícias para ex-governadores, mas hoje se enquadra em outra lei, de 2015, que limita o benefício a 4 anos e de forma proporcional ao tempo no governo. Existe um parecer da PGE sobre o caso, que hoje virou uma briga na justiça com o Partido Novo. Não é um ponto pacífico e muita água vai rolar.
Pá de cal
O capital político é construído aos poucos, capturando eleitores através de posicionamentos e de todos os elementos subjetivos do candidato. Aparência, empatia e ideias ditas ou implícitas. É muito difícil calcular quantas pessoas votaram em Leite por conta da simpatia com a ideia de repúdio à reeleição, ou da figura de um jovem “nova política” que trata o gasto público com austeridade. Tentando reeleição com aposentadoria aos 37 anos, é colocada uma pá de cal na carreira política de Leite, que passa a ser só mais um político brasileiro. Bom de papo e ginasta da retórica, mas só mais um.
Palavra final
Leite gosta muito de repetir sem parar que é preciso acabar com a polarização no Brasil, mas esquece que existe uma bem especial por aqui: a polarização entre os políticos que gostam de mamar nos cofres públicos e aqueles que não gastam além do mínimo e também não usam o fundão eleitoral, diárias ou “auxílio mudança”.
Vídeos postados no Youtube com conteúdo protagonizado por Onyx Lorenzoni no canal da Band RS têm desempenho superior aos demais
A Rede Bandeirantes realizou na segunda, dia 8 de agosto, o primeiro debate com os candidatos ao governo gaúcho nas eleições de 2022. Participaram oito dos dez concorrentes: Vieira da Cunha (PDT), Edegar Pretto (PT), Eduardo Leite (PSDB), Luis Carlos Heinze (PP), Onyx Lorenzoni (PL), Ricardo Jobim (Novo), Roberto Argenta (PSC) e Vicente Bogo (PSB).
O debate teve uma duração de duas horas e você pode conferir na íntegra no link abaixo:
Costume tradicional nos podcasts, os “cortes” ganharam vida também nos canais das TVs na internet. Eles são momentos especiais do conteúdo escolhidos pelos editores e repostados no Youtube. Como estes pequenos vídeos são protagonizados por um candidato em especial ou representam tópico específico – muitas vezes apoiado pelo texto escolhido para a miniatura – acabam virando um termômetro da popularidade dos candidatos nas redes.
A Band postou cerca de 30 cortes após o evento e a diferença de visualizações entre eles é gritante, com grande predomínio dos vídeos favoráveis a Bolsonaro. Foram 24 destaques do debate e 8 considerações finais. O vídeo mais visto até o momento da edição deste texto foi o “Edegar Pretto (PT) questiona Onyx Lorenzoni (PL) sobre rompimento com Eduardo Leite”, com 706 mil visualizações, 28 mil curtidas e 3.865 comentários. Apesar de ser o “momento” do candidato petista perguntar ao bolsonarista, a “miniatura” que divulga o corte mostra Onyx com a frase “Ou tá com Lula ou tá com Bolsonaro”.
Os cortes do segundo ao quarto lugar também são identificados com Lorenzoni, obtendo 67 mil, 21 mil e 16 mil visualizações. Até nos vídeos de “considerações finais” o candidato do PL ficou na frente: 3800 contra 511 de Eduardo Leite.
Onyx líder nas miniaturas
O arranjo descompassado entre protagonista do corte (ou quem pergunta para o concorrente) e a miniatura que divulga o vídeo – escolhas dos editores da Band – acabou por favorecer o candidato do PL. Foram 6 “figurinhas” para Onyx, 4 para Jobim e Vieira, 3 para Argenta, 2 para Bogo, Leite e Heinze e apenas uma para Pretto. Os vídeos, por sua vez, são equânimes: cada candidato perguntou 3 vezes para um concorrente. O petista Pretto fez perguntas para Vieira, Heinze e Lorenzoni, mas só virou figurinha quando indagado por Bogo.
Em tempos de algoritmos com critérios que só os desenvolvedores das bigtechs conhecem, esta forma de publicação pode distorcer um pouco a percepção da realidade e desempenho de candidatos. De qualquer forma, é pouco para explicar o enorme sucesso de Onyx em visualizações. O conteúdo do candidato, provavelmente, caiu na rede bolsonarista nacional, que admira o confronto contra o PT, especialmente pelo mote “Está com Lula ou Bolsonaro”. Existe significativo número de comentários nos vídeos de pessoas que dizem não serem do Rio Grande do Sul, mas apoiam o que foi dito.
Por fim, surpreende o desempenho pífio de Eduardo Leite com a audiência. Dos seus três pronunciamentos publicados, um serviu de escada para Onyx faturar 67 mil visualizações (O Senhor Priorizou um Projeto de Poder) e “traço” com os temas geração de emprego e investimento em segurança.
A eleição nem começou, mas a Band deu o tom. Os cortes serão uma ferramenta importante na divulgação dos canais e os candidatos devem correr na frente para fabricar os próprios, com o mesmo conteúdo mas com o tom que lhes favoreçam. E o eleitor (que vota no RS) que decida pelo melhor.
Mateus Wesp quer a marca do “deputado que trouxe mais de meio bilhão” para a cidade, incluindo até dinheiro federal do aeroporto
Passo Fundo recebeu um impresso do deputado estadual Mateus Wesp na última semana. De título “Prestação de Contas (2019-2022) – O Trabalho do Deputado que Trouxe Mais de Meio Bilhão de Reais para Passo Fundo e Região”, o panfleto amarelinho de 10 páginas apareceu na caixa de correio de muita gente na cidade.
Wesp e seu panfleto amarelo: uma lista de conquistas heróicas.
A distribuição maciça do material coincidiu com a visita a Passo Fundo do ex-governador Eduardo Leite (sexta, 22 de julho) e com uma festa de aniversário para deputado em CTG, na presença de tucanos estaduais.
A Lócus teve acesso ao livrinho, o qual lista realizações do deputado, envios de verbas e mostra como o político tem (ou teria) ótimas relações com o Executivo, que dá atenção para seus pedidos especiais. Tudo acompanhado do bordão “Sem deputado Wesp / Com deputado Wesp” a cada item.
Depois de elencar milhões aqui e ali em emendas e programas governamentais para a saúde da região, a página 2 destaca algo curioso: “a pedido do deputado”, escolas de Passo Fundo, Carazinho, Getúlio Vargas e Soledade foram inseridas no “Programa Avançar na Educação”, escolhidas entre outras 54 para se tornarem “Escola Modelo”.
Acima: dinâmica e cidades das escolas escolhidas para integrarem o programa “Escola Padrão”, segundo documentação do Governo RS.
É de se espantar que o Executivo, com equipe técnica na área da educação, economia e tantos outros departamentos da máquina pública na mão receba de um deputado seleção de escolas para programas. Mais estranho ainda é consultar a documentação do Programa Avançar Na Educação e constatar que o programa Escola Padrão selecionou 52 escolas a partir do Índice de Infraestrutura das Escolas, calculado pelo Departamento de Economia e Estatística (DEE/SPGG), garantindo pelo menos uma escola por Coordenadoria Regional e preferencialmente sem projeto ou obra em execução e mais 3 indígenas e uma quilombola.
Responsável por tudo
O deputado segue dando a entender que tudo de bom é causado por seu mandato. A fazenda da Brigada Militar arrendada? Obra de Mateus Wesp. A Cadeia Pública? Obra de Mateus Wesp. Estradas? Turismo? Tudo era mato antes de 2019. Paulo Maluf está orgulhoso do deputado gaúcho, esteja onde estiver.
Rei do marketing: sem o deputado Wesp, pessoas morrem nas estradas. Graças a ele, tudo melhorou ou vai melhorar.
Aeroporto de Passo Fundo e Impostos
Wesp fez a obra sair do papel e desembarcou com o governador Eduardo Leite por aqui para dar a ordem. No imposto de fronteira, por ter votado sim ao fim da cobrança (assunto polêmico, já que outras forças políticas declaram que não foi bem assim) – o deputado também se considera responsável por tal feito. Ele também significa “contas em dia” e outras diversas benesses.
Wesp e Leite: nunca antes na história deste Estado.
Meio bilhão
O panfleto acaba com uma lista de valores precedida pelas afirmações “Nunca um deputado estadual e um governador trouxeram tantos investimentos para Passo Fundo e região. Total de investimentos: mais de meio bilhão de Reais”. No tabelão de emendas e recursos, os destaques somam R$ 551 milhões. Entre eles, o dinheiro federal para a reforma do aeroporto Lauro Kortz – a cereja do bolo neste conjunto de exageros, promoção pessoal e um festival de dados sem referência. Ainda bem que o o material deixa uma última mensagem: pago com recurso próprio. Imaginem isso tudo financiado pelo dinheiro dos pagadores de impostos? Aí seria demais.
Neste ano eleitoral, avançam os gastos com diárias na Assembleia e o líder até o momento é o deputado de Passo Fundo
O deputado Mateus Wesp (PSDB) já recebeu mais de R$ 27 mil em diárias até o momento na Assembleia Legislativa. Segundo a Transparência do Governo RS, os valores são referentes a viagens entre janeiro e junho deste ano, com diárias lançadas no “futuro” para duas empreitadas no RS, provável erro no sistema. O valor deixa o deputado na liderança dos gastos, seguido por Elton Weber (PSB) com R$ 26 mil e Antônio Valdeci Oliveira (PT) com R$ R$ 25 mil.
Todo o Legislativo gastou R$ 1,5 milhão em 3819,5 diárias até o momento.
A metade dos gastos de Wesp ficou por conta da viagem com destino aos Estados Unidos em março, para acompanhar Eduardo Leite. O deputado visitou Nova Iorque, Austin e Washington. A presença de alguém do Legislativo em comitiva de “exibição de potencialidades e conhecimento de novas tecnologias” é, no mínimo, discutível. As 7 diárias ficaram em R$ 14.358,68.
Em 2021, Wesp consumiu R$ 17 mil em diárias (29), contra R$ 12 mil em 2020 (20) e R$ 24,6 mil em 2019 (30,5). O deputado encerrará o último ano com o maior gasto durante o mandato e talvez como campeão entre todos os políticos da casa.
Wesp está na liderança
O deputado por Passo Fundo Mateus Wesp já apareceu em diversos levantamentos da Lócus sobre gastos com diárias e gasolina, sempre ocupando boas posições (para o deputado, nem tanto para o contribuinte). Você pode conferir alguns destaques aqui, aqui e aqui.
Diárias consumidas até o momento e registradas no Portal da Transparência, para todo o Poder Legislativo. Acesse aqui o portal. Em 2021 INTEIRO, os gastos foram de R$ 1,91 milhão para 4566 diárias.
“Ah, mas eu trago recursos”
Muitos dos políticos confrontados com o alto gasto em viagens respondem que “estão trabalhando” e “trazendo recursos”, termo para fazer o que tem que ser feito e retorno dos impostos já pagos pelo contribuinte. A diária acaba virando uma espécie de comissão pelos serviços prestados que é adicionada ao já gordo salário. Outra coisa ainda mais séria e já falada por aqui: e quando o político tira diária e gasolina para viajar e gasta metade do tempo em evento partidário na cidade destino? Isso não tem cabimento, mas acontece muito.
É bom ficar de olho em todos, de Porto Alegre e de Passo Fundo.