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Covid-19

A cultura do denuncismo

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Cidney Antonio Surdi Junior*

A história nos mostra que muitos regimes autoritários adoravam essa psicologia – a cultura do denuncismo. Não por acaso, tem sido incentivada nas atuais circunstâncias e as consequências têm sido nefastas.

Muitas pessoas assumiram a defesa intempestiva do lockdown e das medidas restritivas como formas de combater a contaminação do vírus chinês. Muitas vezes, essa defesa é expressa na forma de ações que, ao seu ver, são dotadas de valor social e cívico: denunciar a vida alheia em nome da saúde pública, gerando batidas policiais em festas particulares, invasões a residências e detenção de familiares reunidos, abordagens de famílias fazendo picnic ou fechamento de pequenos comércios fisicamente impossíveis de gerarem aglomerações. A coisa não vai bem.

O sábio São Tomás de Aquino ensinou que um dos grandes problemas da moralidade humana não é aplicar uma regra geral as condutas, mas ter a percepção refinada em “ler” cada situação concreta que a vida nos apresenta, relacionando com as regras morais. Isso porque cada situação implica numa série de contradições, consequências e motivações variadas. O ser humano não julga igual a um computador que, invariavelmente, aplica fórmulas independentes do conteúdo dos arquivos.

No entanto, quando o indivíduo assume uma regra invariável e passa a fiscalizar a vida alheia com base nesta regra, certamente ele correrá o risco de não perceber a realidade com toda a clareza – porque sua atenção estará voltada exclusivamente para a regra geral, e não para a realidade. No caso atual, muitos que assumem o dever social de denunciar aglomerações em residências ou pequenos comércios em vilas e bairros, possivelmente já assumiram como válidas todas as narrativas oficias propagadas pelos governos estaduais, e deixaram de perceber o grau de realidade desta narrativa e das situações concretas.

Em São José-SC,  por conta da denúncia de um vizinho, uma festa de aniversário acabou em detenção dos envolvidos; em Cuiabá-MT, um morador denunciou uma aglomeração em fila, só não mencionou que se tratava da entrega de apostilas escolares e kits de alimentação para população carente. Em Marília-SP, outra denúncia de aglomeração ignorou o fato de ter chovido e causado o recolhimento das pessoas a marquise do local. Em Atibaia-SP, um cidadão denunciou aglomerações ocorridas dentro de um condomínio residencial, admitindo que não havia casos de coronavírus. Os exemplos aumentam diariamente. Evidentemente, quando há o bom senso, o exercício da cidadania se torna algo responsável. Mas o exagero da cultura do denuncismo leva a tais absurdos.

A história nos mostra que muitos regimes autoritários adoravam essa psicologia – a cultura do denuncismo. O historiador Orlando Figes, no livro Sussuros: a vida privada na Rússia de Stalin, conta como a esfera da vida privada naquele país foi sendo destruída mediante o incentivo a denúncia, criando uma cultura da desconfiança e da mesquinharia. Os cidadãos eram incentivados a espionar a vida alheia, de modo a denunciar todo desvio de conduta ideológica ou não alinhamento com aquilo que o regime entendia como conduta correta. Basta recordar a história do jovem Pavlik Morozov (1918-1932), um menino que se tornou mártir e Herói da União Soviética por ter denunciado o próprio pai e avô. Estátuas, filmes e pôsteres do menino foram espalhados como incentivo a conduta ideal do cidadão responsável. Na Alemanha de Hitler, a bem doutrinada Juventude Nazista era incentivada a denunciar vizinhos e familiares pelo não alinhamento ao regime, criando uma geração de espiões da vida alheia, das origens familiares e das crenças particulares.

A responsabilidade individual é o fundamento das nossas ações – particulares e sociais. Evidentemente, em se tratando de uma situação sanitária de risco, a extensão das ações de um indivíduo contaminado, pode prejudicar outras pessoas, portanto sua responsabilidade envolve consequências a outros. Mas assumir a postura de fiscal da vida alheia, inevitavelmente, é estender o braço forte do Estado que abarca e deglute as liberdades dos indivíduos. A longo prazo, é certo, cria uma doença da alma.

 

*Cidney Antonio Surdi Junior – Professor e pesquisador na área de história da educação, filosofia e cultura. Criador do canal Filosofando Podcast e pai do Dante.

** A imagem destacada é do filme Janela Indiscreta, de Alfred Hitchcock. Em Greenwich Village, Nova York, L.B. Jeffries, um fotógrafo profissional, está confinado em seu apartamento por ter quebrado a perna enquanto trabalhava. Como não tem muitas opções de lazer, vasculha a vida dos seus vizinhos com um binóculo, quando vê alguns acontecimentos que o fazem suspeitar que um assassinato foi cometido.

Covid-19

Mais de dois anos depois, a Prefeitura de Passo Fundo ainda gasta milhões com o coronavírus

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gasta milhões

De folha de pagamento até ajuda para grupos artísticos, muito dinheiro vai para a conta do vírus na cidade

Lá se vão quase 900 dias desde o primeiro caso de COVID-19 na cidade de Passo Fundo, mas o problema financeiro parece longe de acabar. A “Transparência COVID” da prefeitura aponta um gasto empenhado de R$ 7 milhões em 2022, até o dia 6 de setembro. Deste valor, foram pagos R$ 6,88 milhões.

A lista de beneficiados em 2022 com dinheiro público tem 260 nomes. Há pagamentos para empresas fornecedoras da saúde, como esperado, mas a maioria entrou como folha de pagamento (R$ 4,1 milhões). Passo Fundo ainda pagou R$ 800,00 para 203 pessoas a título de “Auxílio a Pessoas Físicas”, dentro de programas culturais em parceria com o governo do Rio Grande do Sul.

Acima: habilitação da Prefeitura de Passo Fundo em edital para cultura no governo do estado. Publicação do DOE completa, aqui.

Entidades tradicionalistas foram contempladas através da Lei 5564/2021, criadora do auxílio específico para o setor. A Lei do Executivo projetou um impacto financeiro de R$ 270 mil. As entidades receberam valores entre 5 e 20 mil Reais e precisam prestar contas das despesas autorizadas, que vão de pagamentos de aluguéis até despesas com instrutores.

Câmara aprovou

É bom lembrar que os gastos extras com dinheiro municipal passaram pela Câmara de Vereadores de Passo Fundo, com aprovação. Tema delicado, mas que exige uma avaliação profunda da casa para que fiscalize a destinação dos recursos, prestação de contas e o real impacto no orçamento de Passo Fundo, seja para mais ou para menos: se a cidade ficará prejudicada por falta de recursos que foram aplicados nos auxílios ou se o gestor teve liberdade para realizar gastos – perante a folga – que não realizaria em tempos normais. Que aliás já são normais faz tempo para quem não ganha dinheiro público em época de eleição.

Listão

Direto da transparência da Prefeitura de Passo Fundo, a lista com as pessoas e entidades beneficiadas com auxílio ou que tiveram produtos ou serviços pagos na “Conta COVID” no ano de 2022 (até o dia 6/9). Acesse aqui o PDF.

Veja também

Socorro aos artistas passo-fundenses: dinheiro público para aliviar os efeitos da pandemia (agosto de 2020)

Mas afinal, quanto dinheiro o Governo Federal mandou para Passo Fundo gastar com a pandemia? (setembro de 2020)

 

 

 

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Candeia: “Lockdown não teve eficácia nenhuma”

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Recentemente, o Ministério da Saúde brasileiro decretou o fim do estado de emergência sanitária nacional. Na tribuna, Rodinei Candeia (REPUBLICANOS) apontou os erros e acertos dos órgãos públicos durante a pandemia de Covid-19.

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Candeia critica atuação do Conselho Municipal de Direitos Humanos em Passo Fundo

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Eu vejo que essas entidades que se dizem protetoras dos direitos humanos em verdade usam as suas posições para impor o entendimento verdadeiramente político-ideológico sobre o comportamento das pessoas, querendo sobrepor a competência que tem o Executivo Municipal para tratar dessas matérias.” (Candeia)

Poucas semanas atrás, o prefeito de Passo Fundo Pedro Almeida se manifestou nas redes sociais acerca do uso obrigatório de máscaras na cidade. Na ocasião, disse que achava prudente a liberalização do uso em locais públicos, posteriomente promulgando decreto. Ocorre que muitas pessoas já não estavam usando máscara em locais públicos, embora muitos respeitassem as exigências relacionadas a ambientes fechados. Acabou sendo mais discurso do que uma ação efetiva sobre essa questão na cidade. Na prática, no entanto, muitos deram aquela interpretação lato sensu para o decreto, deixando até mesmo de usar máscaras em ambientes fechados.

Leia mais em: Pedro Almeida decide colocar na conta de Bolsonaro a história das máscaras

Nesta história, é certo que alguns grupos, sobretudo aqueles que marcaram seu posicionamento “pró” tudo o que estava relacionado a covid e suas medidas autoritárias e restritivas, não deixaria o assunto por isso mesmo. E foi o que fez a Comissão de Direitos Humanos de Passo Fundo.

Então a CDHPF protocolou ação civil pública, a fim de obrigar a população a voltar a utilizar máscaras. Na Sessão Plenária do dia 30 de março, o vereador Rodinei Candeia criticou a postura da entidade:

“Eu vejo que essas entidades que se dizem protetoras dos direitos humanos em verdade usam as suas posições para impor o entendimento verdadeiramente político-ideológico sobre o comportamento das pessoas, querendo sobrepor a competência que tem o Executivo Municipal para tratar dessas matérias”.

Veja, a seguir, o trecho em que o parlamentar trata do assunto na tribuna:

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